Ronaldo acende debate sobre hipotireoidismo
15 de fevereiro de 2011
postado por Cinthya Leite
Ao lado do filho Alex, Ronaldo disse que convive com hipotireoidismo (Fifa.com)
Antes de começar a ler este post, desarme-se de qualquer ideia que relacione o hipotireoidismo a um bicho de sete cabeças. Como vocês sabem, o atacante Ronaldo, eleito o Jogador do Ano da Fifa em três temporadas (1996, 1997 e 2002) e conhecido como Fenômeno por suas arrancadas excepcionais, afirmou ontem (14/2), em entrevista de despedida dos gramados, que convive com hipotireoidismo.
A disfunção, vale explicar, é caracterizada pela falta de atividade da tireoide, glândula pequenina situada no pescoço e que pesa não mais que 30 gramas. Porém, ela exerce uma baita influência no funcionamento de todo o organismo. É como se a tireoide atuasse como a maestrina de uma orquestra superimportante. Afinal, essa glândula mal começa a desandar e os órgãos saem do tom. Tanto descompasso é causado pela alteração no TSH, que é o hormônio que estimula a tireoide.
No depoimento em que anunciou o fim da carreira aos 34 anos (destes, 19 de carreira), Ronaldo revelou que, há quatro anos, no Milan, descobriu ser portador do hipotireoidismo. Disse ele que, para controlar o distúrbio, teria que tomar alguns hormônios, que no futebol seriam configurados como doping.
Ao conversar com o profissional de educação física Manoel Costa, ph.D. em ciências do desporto e professor da Universidade de Pernambuco (UPE), soube que o uso de levotiroxina (princípio ativo da medicação usada para o tratamento da disfunção) em dosagens recomendadas, por pacientes diagnosticados com hipotireoidismo, não é uma condição que possa ser considerada doping.
“Se o atleta tem o distúrbio e precisa fazer realmente uso da medicação para tratar a disfunção da tireoide, ele pode seguir o tratamento e, por questão de segurança, até solicitar autorização à comissão esportiva do Comitê Olímpico Brasileiro. Dessa maneira, tem liberação para competir”, explica Manoel Costa. O depoimento do especialista condiz com a publicação Informações sobre o uso de medicamentos no esporte (2010), do Comitê Olímpico Brasileiro (COB).
Segundo o material, de 45 páginas, “considera-se como doping a utilização de substâncias ou métodos capazes de aumentar artificialmente o desempenho esportivo, sejam eles potencialmente prejudiciais à saúde do atleta ou a de seus adversários, ou contrário ao espírito do jogo. Quando duas destas três condições estão presentes, pode-se caracterizar um caso de doping, de acordo com o Código da Agência Mundial Antidoping (AMA)”.
Quem toma os comprimidos para controlar a função da tireoide segue uma terapêutica por questão de saúde, concordam?!? Assim, acredito que, no caso de pacientes que realmente precisam da levotiroxina para controlar o hipotireoidismo, seria até injusto a medicação entrar no rol das substâncias proibidas relacionadas na lista de substâncias e métodos proibidos da Agência Mundial Antidoping (AMA).
Segundo Gustavo Caldas, o tratamento do hipotireoidismo é seguro e simples. Para isso, é necessário um diagnóstico preciso (Foto: Divulgação / SBEM)
Sobre esse assunto, conversei também com outro profissional da área da medicina esportiva, que solicitou não ser identificado porque o cargo não permite. Segundo ele, o atleta com hipotireoidismo em tratamento não se encontra num critério para deixar o treinamento e as competições de lado. “O problema aparece quando a prescrição do paciente com hipotireoidismo apresenta também substâncias que são proibidas, como diuréticos e esteroides”, informa o médico.
De acordo com o endocrinologista Gustavo Caldas, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Endocrinolgia/Regional Pernambuco (SBD/PE), a terapêutica do hipotireoidismo é uma das mais seguras e simples da especialidade. Inclusive, gestantes e bebês com o distúrbio fazem uso da levotiroxina.
Ou seja, não há mistério no tratamento dessa disfunção da tireoide. “O paciente passa por testes clínicos e se submete ao exame do TSH, feito através de uma amostra de sangue”, enfatiza o endócrino, que acrescenta: “Se o nível desse hormônio estiver irregular, já se suspeita de hipotireoidismo, que é uma doença comum e simples de tratar”.
Ele ainda chama atenção para o fato de muitas pessoas jogarem a culpa do excesso de peso no hipotireoidismo, já que o distúrbio deixa o metabolismo mais lento. “O ganho de peso que se tem por causa dessa disfunção da glândula não é muito grande. Assim, os níveis inadequados dos hormônios da tireoide, sozinhos, não justificam a obesidade”, salienta Gustavo Caldas.
Segundo o médico, quando o hipotireoidismo está muito avançado, a pessoa tende a ganhar cerca de cinco quilos no máximo. Mas com o tratamento, o peso volta ao normal, assim como todas as funções do organismo que estavam fora do compasso por causa da glândula que trabalhava lentamente.
Acredite: foi assim comigo. Hoje, eu convivo normalmente com hipotireoidismo. Mas antes de ter o diagnóstico, há uns cinco anos, sentia um cansaço imenso e uma apatia fora do comum. Até achei que fosse depressão, mas o meu endocrinologista logo percebeu que minha glândula estava preguiçosa e comecei imediatamente o tratamento.
Para toda a vida, preciso tomar um comprimidinho de levotiroxina diariamente em jejum, o que já faz parte da rotina. Depois que comecei a tomá-lo, rapidinho os sinais desapareceram e nunca mais voltaram. Eis, então, uma prova de que os pacientes com hipo podem ter uma vida ativa, saudável, feliz e completamente normal.
SAIBA MAIS
- O tratamento do hipotireoidismo é feito com o uso diário de levotiroxina, na quantidade prescrita pelo médico. E os comprimidos são em microgramas, variando de 25 a 200, e não em miligramas como a maioria dos medicamentos. Por isso, a levotiroxina não deve ser feita por manipulação, pois a chance de erro é grande
- Para reproduzir o funcionamento normal da tireoide, a levotiroxina deve ser tomada diariamente, em jejum (no mínimo meia hora antes do café da manhã), para que a ingestão de alimentos não diminua a absorção da substância pelo intestino
- Se o hipotireoidismo não for corretamente tratado, pode acarretar redução da performance física e mental do adulto, além de elevar os níveis de colesterol, que aumentam as chances de problemas cardíacos
- Depressão, desaceleração dos batimentos cardíacos, intestino preso, menstruação irregular, falhas de memória, cansaço excessivo, dores musculares, pele seca, queda de cabelo, ganho leve de peso e aumento de colesterol no sangue estão entre os sintomas do hipotieroidismo
- Não se deve confundir hipotireoidismo com hipertireoidismo, pois as disfunções são opostas: enquanto no hipo existe diminuição da produção de hormônios, há aumento no hiper
- Se você desconfia de qualquer problema na tireoide, procure um endocrinologista e não recorra à automedicação
- Leia sobre o assunto: Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e Mulher sem falta
sábado, 19 de fevereiro de 2011
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